Cavalheiros!

Este discurso foi publicado originalmente em 1936, no "The Harmonist", no dia do aparecimento de Sua Divina Graça Om Visnupada Srila Bhaktisiddhanta Sarasvati Thakura.

Em dez curtos anos, Sua Divina Graça A. C. Bhaktivedanta Swami Prabhupada inundou o mundo com a Consciência de Krishna. Neste seu ensaio, ele estabelece o conceito universal de guru.


saksad-dharitvena samastra-sastrair
uktas tatha bhavyata eva sadbhih
kintu prabhor yah priya eva tasya
vande guroh sri-caranaravindam

"As escrituras reveladas declaram que o mestre espiritual deve ser adorado como a Suprema Personalidade de Deus, e este preceito é obedecido pelos devotos puros do Senhor. O mestre espiritual é o servo mais confidencial do Senhor. Desse modo, ofereçamos nossas respeitosas reverências aos pés de lótus de nosso mestre espiritual."

Cavalheiros, em nome dos membros da sede em Bombaim da Gaudiya Math, permitam-me dar-lhes nossas boas-vindas, porque os senhores juntaram-se a nós tão amavelmente na noite em que oferecemos, congregacionalmente, nossa homenagem aos pés de lótus do mestre mundial, Acharyadeva, que é o fundador desta Missão Gaudiya e é o Presidente-Acharya da Sri Sri Visva-Vaishnava Rajasabha. Refiro-me a meu eterno mestre divino, Paramahamsa Parivrajakacarya Sri Srimad Bhaktisiddhanta Saraswati Goswami Maharaj.

Há sessenta e dois anos, neste dia auspicioso, o Acharyadeva fez seu aparecimento em resposta ao apelo de Thakur Bhaktivinod em Sri-Ksetra Jagannatha-dhama em Puri.

Cavalheiros, o oferecimento desta homenagem tal como foi programado para esta noite, ao Acharyadeva não é um assunto sectário, pois quando falamos do princípio fundamental de gurudeva, ou acharyadeva, estamos falando de algo que é de aplicação universal. Está totalmente fora de cogitação discriminar meu guru do seu ou do de qualquer um. Só há um guru, que aparece em uma infinidade de formas para ensinar aos senhores, a mim e a todos os demais.

O guru, ou acharyadeva, como aprendemos com as escrituras fidedignas, transmite a mensagem do mundo absoluto, a morada transcendental da Personalidade Absoluta, onde tudo sem exceção serve à Verdade Absoluta. Temos ouvido tantas vezes: mahajano yena gatah sa panthah, "Trilhem o caminho pelo qual andou seu acharya anterior", porém mal e mal temos tentado entender o real significado deste sloka. Se estudarmos minuciosamente esta proposição, entenderemos que o mahajana é um só, e o caminho real para o mundo transcendental também é um só. No Mundaka Upanisad (1.2.12) se diz:

tad-vijnanartaham sa gurum evabhigacchet
samit-panih srotriyam brahma-nistham

"A fim de aprender a ciência transcendental, devemos aproximar-nos do mestre espiritual fidedigno, em sucessão discipular, quem está fixo na Verdade Absoluta."

De forma que aqui se prescreve que, a fim de recebermos esse conhecimento transcendental, devemos aproximar-nos do guru. Portanto, se a Verdade Absoluta é uma só, sobre o que julgamos não haver divergência de opinião, o guru também não pode ser dois. O Acharyadeva, em cuja honra nos reunimos hoje à noite a fim de oferecer nossas humildes homenagens, não é o guru de uma instituição sectária ou um dos muitos diferentes expoentes da verdade. Pelo contrário, ele é o Jagad-guru, ou o guru de todos nós; a única diferença é que alguns lhe obedecem sinceramente, ao passo que outros não lhe obedecem diretamente.

No Srimad-Bhagavatam (11.17.27) o Bem-aventurado Senhor diz:

acharyam mam vijaniyam
navamanyeta karhicit
na martya-buddhyasuyeta
sarva-devamayo guruh

"Deve-se entender que o mestre espiritual é tão bom como Eu. Ninguém deve ter inveja do mestre espiritual ou pensar que ele é um homem comum, porque o mestre espiritual é o somatório de todos os semideuses." Isto é, o acharya é identificado com o próprio Deus. Ele nada tem a ver com os afazeres deste mundo mortal. Ele não desce aqui para imiscuir-se em assuntos de necessidades temporárias, mas para salvar as almas condicionadas caídas –as almas, ou entidades, que vieram ao mundo material com o interesse de desfrutar através da mente e dos órgãos de percepção dos sentidos. Ele aparece ante nós para revelar a luz dos Vedas e outorgar-nos as bênçãos da liberdade completa, pela qual devemos ansiar a cada passo da jornada de nossa vida.

O conhecimento transcendental dos Vedas foi primeiramente comunicado por Deus a Brahma, o criador deste universo particular. De Brahma o conhecimento desceu para Narada, de Narada para Vyasadeva, de Vyasadeva para Madhava, e, neste processo de sucessão discipular, o conhecimento transcendental foi transmitido por um discípulo a outro até chegar ao Senhor Gouranga, Sri Krishna Chaitanya, que representou o papel de discípulo e sucessor de Sri Isvara Puri. O atual Acharyadeva é o décimo representante discipular de Sri Rupa Goswami, o representante original do Senhor Chaitanya que pregou esta tradição transcendental em sua plenitude. O conhecimento que recebemos de nosso Gurudeva não é diferente daquele comunicado pelo próprio Deus e pela sucessão dos acharyas na linha preceptoral de Brahma. Adoramos este dia auspicioso como Sri Vyasa-puja-tithi, porque o acharya é o representante vivo de Vyasadeva, o divino compilador dos Vedas, Puranas, Bhagavad-gita, Mahabharata e Srimad-Bhagavatam.

Cavalheiros, nosso conhecimento é tão pobre, nossos sentidos são tão imperfeitos e nossas fontes são tão limitadas que não é possível termos um pouco sequer de conhecimento da região absoluta sem nos rendermos aos pés de lótus de Sri Vyasadeva ou seu representante fidedigno. A cada momento estamos sendo enganados pelo conhecimento de nossa percepção direta. Tudo não passa de criação ou invenção da mente, que é sempre enganadora, mutante e oscilante. Nada podemos conhecer a respeito da região transcendental através de nosso método limitado e pervertido de observação e experimentação. Mas todos nós podemos ouvir com ávida atenção o som transcendental transmitido daquela região para esta através do meio inadulterado de Sri Gurudeva ou Sri Vyasadeva. Portanto, cavalheiros, devemos nos render hoje aos pés do representante de Sri Vyasadeva para eliminarmos todas as nossas divergências geradas por nossa atitude insubmissa. Dessa maneira, está dito no Sri Gita (4.34):

tad viddhi pranipatena
pariprasnena sevaya
upadeksyanti te jnanam
jñaninas tattva-darsinah

"Aproxima-te apenas do sábio e fidedigno mestre espiritual. Primeiramente, rende-te a ele e tenta entendê-lo através de indagações e serviço. Esse sábio mestre espiritual iluminar-te-á com conhecimento transcendental, pois ele já conhece a Verdade Absoluta."

Para recebermos conhecimento transcendental, devemos nos render completamente ao verdadeiro acharya, em espírito de indagação e serviço ardentes. Real execução de serviço ao Absoluto sob a orientação do acharya é o único veículo pelo qual podemos assimilar o conhecimento transcendental.

O encontro de hoje, para oferecermos nossos humildes serviços e homenagens aos pés do Acharyadeva possibilitará que sejamos agraciados com a capacidade de assimilar o conhecimento transcendental tão bondosamente transmitido por ele a todas as pessoas, sem distinção.

Cavalheiros, embora de modo tão imperfeito, fomos capacitados pela graça dele a compreender as sublimes mensagens de nosso Acharyadeva, Om Visnupada Paramahamsa Parivrajakacarya Sri Srimad Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Maharaja. Devemos, contudo, admitir termos compreendido definitivamente que a mensagem divina de seus lábios de lótus é coisa inata para a humanidade sofredora. Todos nós deveríamos ouví-lo pacientemente. Se ouvirmos o som transcendental sem descabida oposição, certamente a misericórdia cairá sobre nós. A mensagem do Acharyadeva é para levar-nos de volta a nosso lar original, de volta a Deus. Repito, portanto, que deveríamos ouví-lo pacientemente, segui-lo na medida de nossa convicção e prostrar-nos a seus pés de lótus para nos livrarmos de nossa atual e imotivada falta de vontade de servir ao Absoluto e a todas as almas.

Sentados aos pés de lótus do Acharyadeva, tentemos entender desta fonte transcendental de conhecimento o que nós somos, que é o universo, que é Deus e qual é o nosso relacionamento com Ele. A mensagem do Senhor Chaitanya é a mensagem para as entidades vivas e a mensagem do mundo vivo. O Senhor Chaitanya não Se importou com a elevação deste mundo morto, que é adequadamente chamado de Martyaloka, o mundo onde tudo está destinado a morrer. Ele apareceu perante nós, há quatrocentos e cinquenta anos, para nos falar algo do universo transcendental, onde tudo é permanente e tudo existe para o serviço ao Absoluto. Porém, recentemente o Senhor Chaitanya tem sido mal representado por algumas pessoas inescrupulosas, e a mais elevada filosofia do Senhor tem sido interpretada erradamente como sendo o culto do tipo mais baixo de sociedade. Temos a satisfação de anunciar, hoje à noite, que nosso Acharyadeva, com sua bondade costumeira, salvou-nos desse tipo horrível de degradação, e por isso prostramo-nos a seus pés de lótus com toda humildade.

Cavalheiros, tem sido uma das manias da sociedade culta (ou inculta) dos dias atuais atribuir à Personalidade de Deus aspectos meramente impessoais e estultificá-lO, afirmando que Ele não tem sentidos, nem forma, nem atividade, nem cabeça, nem pernas, nem prazer. Este tem sido também o prazer dos eruditos modernos devido a sua completa falta de apropriada orientação e verdadeira introspecção no reino espiritual. Todos esses empiricistas pensam da mesma forma: todas as coisas desfrutáveis devem ser monopolizadas pela sociedade humana, ou apenas por uma classe particular, e o Deus impessoal deve ser um mero fornecedor de encomendas para suas façanhas caprichosas. Sentimo-nos felizes por termos sido livrados desta horrível espécie de doença pela misericórdia de Sua Divina Graça Paramahamsa Parivrajakacarya Bhaktisiddhanta Sarasvati Goswami Maharaj. É ele quem abre nossos olhos, nosso pai eterno, nosso preceptor eterno e nosso guia eterno. Prostremo-nos, portanto, a seus pés de lótus neste dia auspicioso.

Cavalheiros, embora sejamos como crianças ignorantes no conhecimento da Transcendência, mesmo assim Sua Divina Graça, meu Gurudeva, acendeu o pequeno fogo dentro de nós para dissipar a invencível escuridão do conhecimento empírico. Agora estamos tão fixos no lado seguro que nenhuma quantidade de argumentos filosóficos poderá nos desviar um milímetro sequer da posição de nossa eterna dependência dos pés de lótus de Sua Divina Graça.

A verdade simples, tão vividamente explicada no Gita, que é a lição central dos Vedas, não é entendida, ou nem mesmo suspeitada, pelos mais poderosos eruditos das escolas empíricas. Aqui está o segredo de Sri Vyasa-puja. Quando meditamos nos passatempos transcendentais da Divindade Absoluta, temos orgulho de sentir que somos Seus servos eternos, e nos tornamos jubilantes e dançamos de alegria. Toda a glória a meu mestre divino, pois foi ele que, por seu incessante fluxo de misericórdia, despertou dentro de nós tal movimento de existência eterna! Prostremo-nos a seus pés de lótus.

Cavalheiros, se ele não tivesse aparecido diante de nós para nos salvar da escravidão desta grosseira ilusão mundana, certamente teríamos permanecido desamparados por vidas e eras na escuridão do cativeiro. Se ele não tivesse aparecido diante de nós, não teríamos sido capazes de entender a verdade eterna do ensinamento sublime do Senhor Chaitanya.

Pessoalmente, não tenho esperança de executar algum serviço direto nos vindouros milhões de nascimentos da jornada de minha vida, mas confio em que, algum dia, serei salvo deste atoleiro de ilusão em que estou tão profundamente afundado atualmente. Por isso, deixai-me orar com toda a minha sinceridade aos pés de lótus de meu mestre divino para que me permita sofrer o quinhão a mim destinado devido a meus malfeitos passados, mas que eu possa guardar na memória que não passo de insignificante servo da Toda-poderosa Divindade Absoluta, compreendida através da firme misericórdia de meu mestre divino. Deixai-me, portanto, prostrar-me a seus pés de lótus com toda a humildade possível.

Abhay Charan das

Em nome dos Membros da Sri Gaudiya Math de Bombaim