RODEADOS
POR CARMA
Então,
não devemos temer as circunstâncias adversas.
No Bhagavad-gita Krishna diz: "Feliz do kshatriya
que ambiciona por uma batalha como a que enfrentas."
(sukhinah ksatriya partha labhante yuddham idrsan).
Dessa maneira, um mau trabalhador brigará com
suas ferramentas. Nosso carma veio enfrentar-nos, rodear-nos,
e não podemos evitá-lo. Estas perturbações
são o resultado do nosso próprio carma,
saíram de nosso interior. Portanto, não
devemos brigar. Devemos agir apropriadamente quando
lidamos com isto.
Devemos
esquadrinhar mais detidamente aquilo que cremos compreender.
Cada qual deve perguntar-se: "Onde estou? Qual é
a minha verdadeira necessidade? E quão profundamente
anseio por aquilo que é verdadeiro?" Tudo isto
será exteriorizado e saltará à
luz pública. Este é o verdadeiro campo
de sadhana, ou prática. Nossa prática
e nosso progresso, necessitam de todas essas dificuldades.
Do contrário, poderíamos seguir ignorando
o que é progresso, nos converteríamos
em hipócritas e transmitiríamos a outros
as mesmas coisas adulteradas. Portanto, é necessário
que todas essas perturbações cheguem para
purificar-nos.
E
em Deus não há erro. Ele comanda o meio
ambiente. Não é nossa responsabilidade.
A responsabilidade do meio ambiente não recai
sobre nós. Nossa única responsabilidade
é conosco mesmo. O meio ambiente está
nas mãos do Senhor. Ele não me fez nada
de mau. Se sou sincero, terei que adaptar-me a esse
meio ambiente e depositar minha fé nEle. Devido
a nossa posição, nosso patriotismo será
posto à prova, em qualquer circunstância,
durante a batalha. Seremos provados para ver se somos
verdadeiros soldados ou não.
Qualquer
coisa pode acontecer, contudo teremos que encará-la.
Sob nenhuma circunstância devo esquecer meu Senhor,
meu Guru, meu Gouranga e meus Radha-Govinda. Em meio
a qualquer circunstância desfavorável deverei
permanecer com a cabeça erguida e dizer: "Sim,
sou um servo deste grupo, deste sampradaya! Pode
ser que todos me abandonem, porém continuarei
só." Devemos seguir adiante com essa atitude,
não importa quais sejam as circunstâncias
que nos rodeiem. Depois, se me poderá outorgar
algum reconhecimento: "Sim, apesar de todas as tribulações,
ele se manteve firme." Nossos superiores se sentirão
complacentes conosco.
Devemos
analisar-nos. Quão egoístas somos? Até
que ponto estão enraizados os anarthas,
ou hábitos indesejáveis, em nossos corações?
Até onde se encontram misturados com nossa fé
verdadeira as impurezas de carma, jñana,
desejos mentais e outras imundícies? Tudo isso
terá que aflorar e ser eliminado de diversas
maneiras. Ninguém poderá causar-nos danos
se desejarmos o bem verdadeiro. Devemos nos mover com
esse espírito, e depois compreenderemos as coisas
tais como são.
JESUS
E JUDAS
Mesmo
Cristo disse a seus seguidores: "Um de vós me
traireis." Judas era um dos doze. Portanto, Jesus disse:
"Um dos doze me entregará ao inimigo nesta mesma
noite." Até isto pode ser possível. Ele
disse: "Inclusive tu, Pedro, me negarás três
vezes esta noite, antes que cante o galo." "ó,
não, não, não posso negar-te."
Mas, na verdade, o Senhor não tolera orgulho
em um devoto. Ele quer rendição, completa
rendição, "Não, não", disse
Pedro. "Sou teu fiel servo." Essa classe de ego não
deve prevalecer. Pedro, o líder, também
ficou comprometido. Portanto, o Senhor não tolera
o orgulho.
Os
devotos são apenas instrumentos nas mãos
do Senhor. Um rei muçulmano anunciou que precisava
de um adulador, um homem que sempre dissesse sim. Antigamente,
usavam-se aduladores nas cortes dos reis para aprovar
tudo o que o rei dissesse. Esse rei anunciou que queria
um adulador e muitos homens se aproximaram para solicitar
o cargo. O rei começou a entrevistá-los
desta maneira:
"Você crê que poderá desempenhar
seus deveres apropriadamente?"
"Sim,
poderei fazê-lo."
"Creio
que não poderá desempenhá-los corretamente."
"Não,
senhor, poderei fazê-lo."
Todos foram descartados, exceto um. Quando o rei lhe
disse:
"Parece-me
que você não está capacitado a levar
a cabo a tarefa de um adulador", ele respondeu:
"Estou
de acordo."
"Não,
não, não", disse o rei. "Você poderá
fazê-lo. Você é o mais indicado."
"Sim,
sou o mais indicado."
"Não,
não", prosseguiu o rei. "Agora duvido."
"Sim,
também duvido."
Afinal,
o rei disse:
"Esse
é o homem que preciso."
Aqueles
que continuamente afirmavam estar capacitados foram
rejeitados e despedidos.
Do
mesmo modo, nossa alma deverá ter essa mesma
flexibilidade no serviço ao Senhor. Não
devemos ter nenhum ego. Naturalmente que isso é
no sentido externo, já que temos nosso ego permanente
interior, que surge quando a alma penetra nesses domínios
mais elevados. Isso é uma coisa à parte.
Entretanto, o ego material deve ser dissolvido cem por
cento. Quando for jogado ao fogo, ficará reduzido
a cinzas.
Além
disso, devemos apontar numa só direção
em nossa busca da verdade. Dronacharya era o astra-guru,
o mestre-de-armas dos Pandavas. Um dia, enquanto examinava
o progresso de seus discípulos, colocou um pássaro
de brinquedo sobre a copa de uma árvore. Logo
pediu aos irmãos que se aproximassem, um por
um, e apontassem. Yudhisthira se aproximou. Dronacharya
disse-lhe:
"Prepara-te para disparar contra o pássaro. Estás
pronto?"
"Sim."
"O
que vês? Vês algo mais?"
"Sim,
vejo todos vós."
"Afasta-te."
Então
outro dos irmãos se aproximou. Dronacharya disse-lhe:
"Dispara
no olho do pássaro. Isso é o que deve
ser atingido por tua flecha. Aponta. O que vês?"
"O
pássaro."
"Algo
mais?"
"Sim,
também a árvore."
"Ó,
afasta-te!"
Então,
veio Arjuna. Dronacharya disse-lhe:
"Prepara-te."
"Sim,
meu senhor, já o fiz."
"Vês
o pássaro?"
"Sim,
vejo-o."
"Vês
a árvore?"
"Não."
"Vês
todo o pássaro?"
"Não."
"O
que vês?"
"Só
a cabeça."
"Toda
a cabeça?"
"Não."
"Então,
o que vês?"
"Somente
o olho."
"Não
vês mais nada?"
"Não,
não posso ver mais nada."
"Bem,
meu filho, dispara tua flecha!"
Esse
é o tipo de pontaria que devemos ter em nossas
vidas. É fazer ou morrer. Não importa
quais sejam as circunstâncias que cheguem para
atemorizar-me, não terei medo. Se meus próprios
homens se convertem em meus inimigos, não importa.
O único que me interessa é Ele, e Ele
não tolera que ninguém mais se converta
em Seu sócio. Ele é absoluto. Ele é
meu dono absoluto. Ele não admite nenhum tipo
de sociedade. Desta forma, devo ir onde minha consciência
espiritual me levar. Pela vontade de Deus, os amigos
podem converter-se em inimigos e os inimigos podem transformar-se
em amigos; porém, devo aferrar-me ao meu ideal.
Se sou de natureza progressista, então terá
que haver eliminação e novos começos.
Isto é inevitável no decorrer de nossa
realização.
Quando
frequentamos a escola, nem todos passam de ano. Alguns
são renovados e teremos que conhecer novos companheiros
de classe. De novo avançamos e uma vez mais teremos
outros companheiros, enquanto alguns dos velhos ficarão
para trás. Isso é algo muito natural.
Isso não quer dizer que estejamos invejosos deles.
Simpatizamos com eles e faremos tudo que estiver ao
nosso alcance para ajudá-los. Não obstante,
tudo isso poderá acontecer. Essa é a natureza
da vida espiritual e não podemos evitá-lo.
O princípio do absoluto e o princípio
do relativo sempre se chocam entre si. Parece que lutam
um contra o outro, porém o absoluto deverá
ser aceito e o relativo deverá ser sacrificado.
PRISÃO
MENTAL
Apesar
disso, o relativo é necessário. Um menino
deve pôr toda sua fé no mestre do primário,
(caso contrário) seu progresso se verá
obstado. Ele não deve pensar que o que o seu
mestre lhe ensina é falso ou de baixo nível.
Quando tiver crescido, terá que aceitar outro
mestre para sua educação superior; contudo
isso não significa que o mestre do primário
deverá ser descartado ou insultado. Para nosso
próprio interesse, devemos aceitar tudo aquilo
que tenha afinidade com o que nosso Guru Maharaj nos
deu, tudo aquilo que nos ajude a compreender mais claramente
o que escutamos dos lábios de nosso Guru Maharaj.
De
outro modo, o que foi que aprisionei em minha mente
durante meu aprendizado? Deus não é algo
finito. Ele é infinito. Deveria limitar-me ao
pouco que pude encarcerar dEle na prisão de meu
cérebro? O que é isto? Minha realização
é algo vivo ou está morta? Há algum
crescimento? Aquilo que recebi de meu mestre espiritual
pode desenvolver-se ou se esgotou? Já alcancei
o nível do infinito, além do qual não
se pode progredir?
Se
alguém afirma que chegou a esse nível
e que não existe nada mais a compreender, oferecemos-lhe
nossas reverências de longe. Não somos
adoradores dessa idéia. Detestamos que alguém
pense que alcançou o final, que logrou a perfeição.
Inclusive um acharya deverá considerar-se
um estudante e não um mestre consumado que tem
tudo. Viemos realizar o infinito, e não o finito.
Portanto, esta luta entre o conhecimento finito e o
conhecimento infinito continuará sem cessar.
Deveríamos
pensar: "O que compreendi é absoluto"? Não!
Não chegamos ao fim do conhecimento. Ainda temos
o que aprender. O próprio Brahma diz: "Fui totalmente
enganado por Teu poder, meu Senhor. Não cheguei
a parte alguma."
Aquele
que conseguiu entrar em contato com o infinito só
poderá dizer: "Não sou nada." Esse deve
ser o ponto relevante. Srila Krsnadas Kaviraj Goswami,
o expoente das escrituras mais importantes do Vaishnavismo
Gaudiya, disse: purisera kita haite muni sei laghista:
"Sou mais baixo que um verme no excremento." Ele é
sincero ao afirmar isto. Deveríamos sentir-nos
envergonhados ao expressar carater negativo? Nosso desenvolvimento
negativo é a verdadeira riqueza para um discípulo.
Porque ele expõe esse carater negativo, prostramo-nos
a seus pés. E se alguém disser: "Dou por
encerrado todo o aprendizado. Deus, Chaitanya, é
meu discípulo", deve-se rejeitá-lo como
o maior inimigo que poderemos encontrar no mundo!